Este tópico me fez pensar algum tempo, e coloco aqui minha opinião pessoal, baseada em reflexões, experiências e pesquisa sobre o tema. E espero que possamos aprofundar a idéia. Para entender o conceito de dor e prazer, fui dar uma passeada pela definição clássica de sadomasoquismo. Kraftt Ebing, médico alemão, foi quem primeiro utilizou os termos Sadismo e Masoquismo no seu livro "Psycopathia Sexualis", em 1885. Sade já era falecido, mas Masoch ainda estava vivo, e isso gerou bastante polêmica na época. Kraftt Ebing substituiu o termo "algolagnia", que estava em vigor na época, para as inexplicáveis relações de prazer e dor que ele começara a documentar e que eram estudadas na época. (Noto que este termo,"algolagnia", é usado até os dias de hoje...embora tenha mais de 150 anos..) Por Sadismo, Kraftt Ebing referiu-se a busca de prazer sexual através do sofrimento imposto à pessoa que lhe faz companhia. É o prazer com o sofrimento alheio. Aqui cabe outra discussão, porque a concepção do personagem e comportamento Sadeano é completamente diferente do que praticamos e acreditamos hoje. Sade era muito mais libertino do que sádico. Mas isto fica para outra hora. Masoquismo, a grosso modo, foi definido como a incapacidade para obter prazer sexual sem sofrimento. É sentir prazer com a dor. O sado-masoquismo é (ainda?) considerado dentro da psiquiatria como sendo uma Parafilia (para = desvio; filia = atração) ou transtorno da conduta sexual em que há preferência por atividades sexuais que impliquem dor, humilhação ou subserviência. Comumente, os indivíduos com esse transtorno obtêm a excitação sexual por comportamentos tanto sádicos como masoquistas. - Beleza, mas, e a dor, o sofrimento? A justificativa médica para a dor é de que os nervos sensoriais das regiões genitais, tanto masculinos como femininos, são os mesmos que transmitem sensações de dor e prazer. O sofrimento como um valor legítimo a ser alcançado, não é novo em nossa cultura. Esteve presente no estoicismo dos gregos, na penitência dos cristãos, e está presente ainda hoje nos regimes alimentares, nos exercícios físicos para o corpo; e o que até bem pouco tempo atrás era enaltecido com jejuns de penitência pela fé, por exemplo, hoje se foca no culto ao corpo. O que observo é que, quando o sofrimento ou a dor está ligada ao erotismo, a tendência é considerá-lo um comportamento doente ou criminoso. Logo, o escândalo do sado-masoquismo não é o sofrimento ou a dor. É sua vinculação ao sexo. - Bom, mas e a dor? A dor é uma experiência humana universal, o que torna falar sobre ela fácil e difícil, ao mesmo tempo. Poderia separar a dor (grosseiramente) em dois lados, a dor física e a dor emocional. Quando falo de dor a seguir, estarei falando da dor física, da dor sensorial. Embora a dor seja um dos tópicos do tema proposto, ela daria uma outra discussão, portanto, vou deixar como a definição da dor, a que existe no universo de cada um. Mesmo porque ela não altera a compreensão deste mail ou minha linha de raciocínio. - E a dor no BDSM? Muitas pessoas fora do BDSM, acreditam ainda, inocentemente, que o(a) masoquista é aquele(a) capaz de sentir toda e qualquer dor como prazer. Bom, mas se fosse assim, eles(as) não necessitariam de nós, os sádicos. Bastaria a eles(as) se auto-flagelarem, infligirem a si mesmos a dor. Jean Paulhan, que foi por muito tempo o objeto de desejo de Dominique Aury, a escritora de "Estória de O", dizia que: "desta forma o homem teria encontrado (a respeito da dor) o que tão assiduamente procura na medicina, na moral nas filosofias e nas religiões." Na verdade creio que o sado-masoquista é aquele que em determinadas situações tem a capacidade de erotizar a dor, fazendo-a perder muito de seu caráter assustador, ao mesmo tempo em que surge ou potencializa o prazer, e não alguém que tenha um orgasmo cortando a própria pele, ou indo ao médico para fazer uma endoscopia. Portanto a dor não é substituída pelo prazer. Este surge concomitante a ela, quase complementar, sendo a atuação da sensação da dor fundamental na relação BDSM, do contrário a relação perderia o sentido. - Primeira conclusão: A dor não substitui o prazer! Na verdade a dor serve como elemento para potencializar o prazer. E não é a dor pela dor. O ser humano é extremamente complexo. Logo, a dor como agente potencializador, tem um efeito bombástico se inserida em uma fantasia ou contextualizada. Exemplo: Um(a) masoquista (com a permissão de vocês, uso aqui a palavra masoquista para definir submissos(as) e masoquistas, indistintamente) sente prazer com o spanking. Mas se o agente potencializador (spanking) estiver contextualizado dentro da fantasia dele(a); por exemplo, um professor severo, uma governanta, ou algo assim, o prazer é mais intenso. O exemplo que dei, na verdade define algo que vejo faltar na maioria das relações BDSM, a elaboração de situação. E como disse anteriormente, o ser humano, é extremamente complexo. Necessita da elaboração, da fantasia, do contexto. - Epa, então temos mais um componente? Exatamente! Temos na verdade três componentes: O prazer, a dor, e a situação onde elas surgem. (contexto). Resumindo: Normalmente temos o prazer dito normal, ou baunilha, seja como sádicos(as) ou dominadores(as), seja como masoquistas ou submissos(as). A dor é uma forma de aumentar este prazer. De amplificá-lo. Então quando associamos o prazer à dor, usamos um instrumento (a dor) para aumentar o prazer. Mas sem o contexto (a situação) o conjunto pode ficar prejudicado. Atenção dominadores homens: Este ponto é especialmente importante se você tem uma submissa ou masoquista mulher! A maioria dos sádicos ou dominadores acha que pelo fato de estarem "no comando" podem fazer o que quiserem, sem se importarem com o contexto da situação. Deixam de elaborar um clima para contextualizar o prazer e a dor, concentrando-se em si próprios. E todos nós sabemos que as mulheres são maravilhosamente elaboradas. Portanto, vamos usar a imaginação? Concluí, depois de todo este discurso que, a dor pela dor, não tem sentido. Ela, no universo BDSM precisa estar erotizada e elaborada, para ter nexo e alcançar à que se propõe: aumentar o prazer seja do sujeito ativo, o que proporciona: (dominador(a)/sádico(a)) seja do sujeito passivo (masoquista/submisso(a)). Logo o(a) masoquista/submisso(a) tem a capacidade de erotizar a dor, utilizando-a como elemento amplificador do prazer. E contextualizada na relação com seu sádico(a)/dominador(a) alcança seu ponto máximo, permitindo novos horizontes e sensações. Mestre Votan |
terça-feira, 22 de março de 2011
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