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quarta-feira, 9 de junho de 2010

"CONCEITO"

Hoje, no limiar do século XXI, muitas diferenças nos mostram como o mundo mudou! O homem, como fator relevante dessa mudança, também teve que mudar. Principalmente em relação ao sexo. Os impulsos mais elementares da satisfação verdadeiramente selvagem ou primitiva tiveram que ser reprimidos, pois outros valores exerceram mais atenção, como o avanço da ciência, da medicina e da tecnologia. Obrigatoriamente o ser humano teve que dominar e controlar o ímpeto da fonte dos instintos.

Por isso, as regras do jogo amoroso também tiveram que se adaptar a novas tendências. Outros nomes foram dados a conceitos há muito arraigados, mas que a luz da verdade trouxe à tona. Não quero discutir os valores humanos e literários de Sade e Masoch. De experiência em experiência, descobri as causas de muitas confusões quando se fala em sadomasoquismo. Essa palavra trouxe muita controvérsia aos não adeptos e aos praticantes. Comecemos com a definição de várias tendências sexuais, atualmente chamadas pelos sexólogos de parafilias, por serem “paralelas às que a maioria pratica”.
Pioneiros da psiquiatria haviam denominado as tendências sexuais que fugiam à prática da maioria como atos “anormais”, “pervertidos”, “depravados”, “desnaturados”. Qualquer variação era “tara”, “desequilíbrio mental”, “maluquice”. Médicos interessados em amenizar os termos pejorativos denominaram “desvio de personalidade” ou simplesmente “desvio”. Assim, foram englobadas todas as tendências estranhas como sendo “sadomasoquismo”, e isso complicou mais ainda.
O Marquês de Sade, em seu túmulo, deve ter aplaudido, tanto Krafft-Ebing, como quem procurava intitular sua predileção com pejorações complicadas. Segundo historiadores, Masoch não gostou de terem unido suas fantasias aos hábitos de Sade. Não achou justo convencionarem denominar as formas exóticas com seu nome, só por tê-las mencionado em suas obras. Achava seus livros românticos, cheios de sentimento de amor e dedicação, o que já não era norma nas obras de Sade. Seus personagens não desrespeitavam nenhuma norma, não causavam mal, não afrontavam a sociedade ou suas regras, quer de natureza física ou mental.
Algumas variantes sexuais, mesmo sendo equilibradas, gratificantes, bem-quistas pela maioria, com estímulos e satisfações sexuais, não foram estudadas a ponto de convencer da necessidade e profundidade do que é o prazer aliado à dor. Antes da psicanálise, não se tinha idéia por que nos faz bem realizar as fantasias e desejos reprimidos. Estudiosos não chegaram a conclusões das CAUSAS que formam, no físico ou no psicológico do indivíduo, esses desejos latentes. Realizados, trazem equilíbrio e satisfação psicológica a quem prefere ser “diferente”.
Lendo antigas narrativas da história, deparamos com cenas de intenso SME (Sado masoquismo-Erótico) e muitas maneiras inusitadas da prática sexual que, no entanto, eram uma constante como estímulo, uma espécie de afrodisíaco. Somente no século XIX passou a ser caracterizado como “perversão sexual”. A razão que leva uma pessoa a insistir nessa prática desde que o mundo é mundo, sempre intrigou quem não entende seus significados e causas, suas razões e porquês.
Com a baixa do falso moralismo imposto pelo afrouxamento da censura e o relaxamento dos padrões sociais mais rígidos, (final da década de 70), vieram a público revistas explícitas sobre assuntos diversos, que são verdadeiros estudos de sexologia. Tornaram-se uma constante os relatos mostrando formas exóticas, mas nada de tão desprezível e temeroso. Em 80, quando outros jornalistas consideravam o SME “pornografia barata”, sem grande interesse, percebi que estava na hora de alguém defendê-lo. Por experiência própria, sabia que não causava nenhum horror. Quem os pratica com equilíbrio, respeita a fantasia e o limite do outro e não prejudica ninguém, apenas realiza suas fantasias tornando-se feliz.
Os adeptos, praticantes (como o cartunista Henfil), simpatizantes e curiosos sentiram que eu respeitava cada tendência do SME, e com seriedade procurava mostrar claramente que tudo não passava de “brincadeirinha de adultos travessos”. Por mais estranhos que me parecessem os desejos de um leitor, nunca critiquei as formas sutis de quem deseja viver o amor e o sexo plenamente. Vi que muitos praticantes do sexo oral, anal, homossexualismo, menage à trois, sexo grupal, ultrapassaram o padrão imposto como “normal” (papai-mamãe). Então por que não o SME? Hoje sinto que contribuí para que muitos entendessem que as variantes podem ser diferentes, mas não condenáveis.
Há pouco tempo, autoridades médicas descobriram várias causas da dor. Assim, consegui entender e explicar cientificamente o prazer da dor aliado à excitação e ao prazer.


Texto de WILMA AZEVEDO. Sadomasoquismo sem medo. São Paulo: Editora Iglu, 1998.

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